domingo, 3 de maio de 2009

FEV 2008 - Parte II - Cirurgia

O Vitor estava em jejum desde o dia anterior... Por volta das 8 horas da manhã, adentrava no Centro Cirúrgico do GRAACC para realizar a cirurgia de alta complexidade no Bulbo (tronco cerebral), local onde estão os controles cardiorrespiratórios. Um dia antes, chegou ao hospital brincando, pulando, sorrindo, pois não tinha nenhum sintoma do tumor que aparecia nas imagens de ressonância magnética. Fomos ao hospital pensando que seria uma consulta e os médicos nos posicionaram da urgência da cirurgia e lá mesmo ficamos.

Foi para o centro cirúrgico sem fazer idéia do que se passaria com ele. Sabia que tinha uma “bolinha” na cabeça e que esta bolinha precisaria ser retirada através de uma cirurgia... Disse também que ele já tinha feito uma cirurgia antes, no ‘pipi” (fimose)... Foi segurando nas mãos um boneco do "Scoob doo" que havia ganhado do papai no dia anterior. Logo e foi anestesiado e dormiu...

Foram momentos muito angustiantes os que passamos na sala de espera do Centro Cirúrgico. Era o Dr. Sérgio Cavalheiro e sua equipe que realizariam a cirurgia. Falaram-nos que o Dr. Sérgio Cavalheiro é o neurocirurgião infantil que mais opera crianças no Brasil e é reconhecido internacionalmente por isto. Ele foi notícia no Fantástico alguns anos atrás, por ter realizado uma cirurgia neurológica intra-uterira. Um feto foi operado dentro do ventre da mãe e a gestação prosseguiu sem problemas ...

Vez ou outra alguém da equipe saia do Centro Cirúrgico e passava informações para nós. A parte mais simples da cirurgia foi a "abertura" , que levou em média 2 horas. Foi utilizado um bisturi elétrico, super preciso, que parava imediatamente se “esbarrava” em algum tecido que não deveria cortar. Quem fez esta parte foram os assistentes do Dr. Sérgio Cavalheiro.Posteriormente um médico me disse que quando abri-se o cérebro, é semelhante a um pedaço de "fígado de boi". Tudo parece igual lá dentro... Como saber o que é tumor e o que são estruturas vitais? Em outras partes do corpo, erros podem até não ser fatais... Mas no cérebro, qualquer "errinho bobo" pode provocar perdas permanentes e até mesmo a morte imediata, dependendo da região.

Por este motivo é que a cirurgia do Vitor foi uma cirurgia "estereotáxica", ou seja, milimetricamente planejada por cálculos matemáticos e físicos.

O Dr. Sérgio Cavalheiro teve acesso ao tumor por volta das 11 horas da manhã e, tendo em vista as imagens da ressonância magnética nuclear e os cálculos matemáticos, começou o momento mais delicado e minucioso da cirurgia. Utilizando um microscópio, começou o seu trabalho de muita delicadeza e paciência. Começou então a “aspirar” o tumor com um equipamento específico. O Tumor estava infiltrado profundamente no bulbo. Ele tentou, tentou e continuou tentando. Todos os equipamentos estavam ligados e quando ele “esbarrava” em determinada parte do tumor, os batimentos cardíacos do Vitor despencavam. Aguardava um período de tempo para recuperar e voltava a tocar naquela parte na tentativa de “aspirar” todo o tumor... Os batimentos caiam novamente. Esperava mais um pouco e tentava novamente. Foram aproximadamente 2 horas de tentativas e não deu. Não foi possível retirar aquela pequena parte do tumor que estava infiltrada... Se é em outra parte do corpo, menos fundamental, “corta-se” um pedaço e pronto. Mama, útero, próstata, pode-se retirar o órgão inteiro, sem maiores problemas. Intestino ou estômago, “corta-se” um pedaço e a pessoa sobrevive. Até mesmo outras parte do cérebro, como hemisférios, por exemplo, pode-se realizar cirurgias mais radicais sem danos à vida. Mas no bulbo, qualquer mínimo erro pode acarretar em morte instantânea.

Tive a chance de conversar com o Dr. Sérgio Cavalheiro por alguns segundos, enquanto ele aguardava o elevador para ir embora... Sua parte havia terminado. Seus assistentes cuidariam de “fechar” a cirurgia... Perguntei como tinha sido e ele disse que tudo bem. Perguntei se havia removido todo o tumor e ele disse: “praticamente. Mais é benigno, é benigno.”. Fiquei preocupada com o termo “praticamente”...

Depois seus assistentes nos falaram sobre as tentativas frustradas de remover o tumor por completo. O exame de “congelação” na hora da cirurgia mostrou que era um tumor de baixo grau. A definição exata do tipo, saberíamos somente quando chegasse o resultado da biópsia.

Resumindo: Foram quase 3 horas pra “fechar” a cirurgia e o Vitor saiu do Centro Cirúrgico rumo à UTI por volta das 15 horas. Havia 15 tubos e cabos pendurados nele, inclusive o respirador mecânico. Estava extremamente inchado e irreconhecível. Foi um choque!

Abaixo, Julia Priolli e Rachel Sterman, da publicação "Gestão em Medicina" entrevistaram o Dr. Sérgio Cavalheiro. O título da matéria é: "O mago das pinças virtuais" .

Sérgio Cavalheiro é neurocirurgião pediátrico. A gentileza que carrega no nome, herança batismal de sua estirpe, se reflete em suas atitudes. Homem de gestos suaves, como um legítimo cavalheiro, tem “duas mãos direitas”. Pudera! Destreza e delicadeza são adjetivos fundamentais para quem opera algo tão pequeno e complexo quanto o cérebro de um bebê em formação. Cavalheiro é referência nacional em cirurgia intrauterina endoscópica e reconhecido internacionalmente por sua contribuição no estudo das patologias neurológicas infantis. “Infantis – enfatiza ele – porque criança é uma outra realidade!” No Laboratório de Biologia Molecular do Instituto de Oncologia Pediátrica da Unifesp, descobriu que o Interferon é capaz de eliminar uma variedade de tumor chamada craniofaringeoma. Recebeu, em Liverpool, o Prêmio Antoni Raimondi, por este grande feito. Desdobrando-se entre docente – titulado a menos de um ano –, pesquisador e cirurgião, não fosse a impossibilidade física de ordem maior, estaria em mais de um lugar ao mesmo tempo, e seu dia teria mais de 24 horas.

Gestão em Medicina: Por que neurocirurgia pediátrica?

Dr. Sérgio Cavalheiro: Faltava algo especializado para criança. A criança não é um adulto jovem, não é um adulto pequeno. A criança é algo mais especial. Devemos pensar em materiais especiais para crianças. Foi por volta de 1986 que nós começamos a nos interessar por essa lacuna que existia na pediatria. Hoje, 100% das cirurgias que eu faço são em crianças. Muitos neurocirurgiões que se dizem pediátricos operam adultos também. Isso é um problema. Claro que por morar em uma cidade como São Paulo, com uma população gigantesca, eu posso me dar ao luxo de operar somente crianças. Um neurocirurgião de uma cidade pequena vai ter de resolver todos os problemas, independente da faixa etária. Mas a grande vantagem de trabalhar só com crianças, é que você desenvolve novas técnicas, material específico e consegue um controle melhor.

Gestão em Medicina: A neurocirurgia é complexa em adultos. É ainda maior em se tratando de crianças? Como fica a questão do envolvimento psicológico dos pais.

Dr. Sérgio Cavalheiro: Se você comparar, por exemplo, com a obstetrícia, que é uma felicidade – é um sucesso toda vez que nasce uma criança –, a neurocirurgia é mais complexa, porque as doenças são sempre graves. Do ponto de vista psicológico é preciso dar muita atenção aos pais. Às vezes os pais são jovens, e é preciso dar ainda mais atenção aos avós, que acabam assumindo o papel dos pais numa situação de estresse como essa. E no final a criança é quem precisa de menos suporte, porque ela não entende muito bem a gravidade do que está se passando. Muitas vezes temos de “enganar” a criança sobre o que vai ser feito, dizer coisas como “drenar um cistinho”. O que você iria que explicar para um paciente adulto, acaba explicando para os pais, para os avós e não para a criança. Facilita demais. A recuperação da criança é muito mais rápida do que a recuperação de um adulto, talvez por ela não ter noção do que está sendo feito com ela. Um adulto quer repouso depois de uma cirurgia cerebral. A criança não! E isso acelera a recuperação, além de que a plasticidade cerebral das crianças é muito maior do que a adulta. Os resultados são muito melhores.

Scoob Doo que o Vitor ganhou do papai no dia anterior

2 comentários:

  1. PERICLES SOARES DO AMARAL16 de julho de 2010 às 12:43

    DEUS NOS ABENÇUOU COM O PROFISSIONALISMO DESTE MÉDICO.DIGO ISSO PORQUE ELE CUIDA DE MEU FILHO ATÉ HOJE O MENINO É UM PRESENTE QUE DEUS NOS DEU.
    OBRIGADO DR SÉRGIO CAVALHEIRO.

    PERICLES S. AMARAL

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  2. Há 11 anos este médico com mãos de anjo operou minha filha com 2 horas de vida(mielomeningocele),em breve trocaremos a válvula de derivação.Estamos muito confiantes, pois em cada consulta percebemos a presença de Deus ao seu lado.
    Obrigada Dr.Sérgio.....

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